Há muito tempo tudo estava parado.
Estranhamente não se ouvia música,
passos pela casa, risos ou lágrimas.
Somente um silêncio corrompia as horas.
Os dias eram vividos como se estivessem
soltos dentro de uma fotografia.
No entanto, vez por outra passava por
seus pensamentos uma lembrança antiga, cheia de cômodos e corredores
empoeirados.
E
vinha aquela presença no livro deixado sobre o criado-mudo, cuja leitura que estava inacabada, ainda povoava relances perturbadores daqueles olhos concentrados nas
palavras, daquelas mãos firmes e belas que nele deixaram marcas. Nada foi mudado de lugar para não
apagar as provas de tudo que foi vivido, como em uma cena de crime que não se
pode alterar.
No seu coração a vida tinha parado ali,
como alguém que morre alguma parte e que continua respirando.
Aquele corpo era um deserto, apenas uma
casa vazia repleta de sensações, de toques, de planos que foram espalhados e
inacabados por todos os lados.
Somente sobrou a vontade, um querer
parecido com sonho, um cheiro trazido pelo vento do fim de tarde que entrava
pelas venezianas.
No jarro as rosas murchas exalavam os
últimos resquícios de perfume.
A história não tinha vírgula,
reticências ou ponto final, apenas parou como se de repente tudo ficasse escuro
e a vida se perdesse.